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sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O BANCÁRIO INSUBORDINADO





Corria o ano de 1965, muita coisa havia mudado no país desde a deposição de Jango, quando ser bancário era uma das melhores profissões do proletariado. Ser bancário anteriormente era ser beneficiado por um Sindicato atuante que conseguira um aumento de mais de 100% no ano, poder fazer uso de um dos mais bem aparelhados hospitais do Rio, que ficava na Lagoa Rodrigo de Freitas e ainda ter como órgão previdenciário o IAPB, instituto bem superior ao das demais categorias, como por exemplo o IAPI ou IAPC. Assim, quando fiz as provas para ser admitido no Banco Cidade do Rio de Janeiro pensava nas mordomias inerentes a profissão daquele ano de vacas gordas. Aprovado, fui enviado para trabalhar na Matriz do banco, que ficava na Candelária, sendo designado para trabalhar na contabilidade do setor de câmbio, que ficava no segundo andar do prédio. Ao chegar, fui bem recebido por todos, fazendo amizade de cara com o operador da máquina de mecanografia, o Arilton, mais conhecido como "Gaúcho", por ser originário lá dos Pampas. Depois das informações preliminares sobre todo o setor, Jorge Omena me designou para trabalhar operando a aludida máquina, uma enorme Burroughs, fazendo os lançamentos de débito e crédito das transações em moeda estrangeira do dia nas fichas dos clientes. Um outro funcionário do setor, o Orlando, ao me recepcionar foi logo dizendo: - O salário do banco é pouco, em compensação ninguém é mandado embora. Não muito tempo depois desta conversa, Orlando foi o primeiro de uma longa lista de demitidos. A razão disto é que o Banco Cidade do Rio de Janeiro foi encampado por um outro mais forte, o Econômico da Bahia. Com a vinda do pessoal do Econômico, houve uma mudança radical no setor onde eu trabalhava. O novo chefe, Alfredo Cravo, me perguntou se eu poderia trabalhar à noite, fazendo o fechamento do balancete diário de moedas estrangeiras. Ante a minha aquiescência, comecei a trabalhar a partir das 18:30 horas, sem horário definido para sair, desde que concluísse o meu trabalho. A princípio era por volta das 22:00hrs, mas rapidamente passei a sair as 20:30hrs. Arilton, o "Gaúcho", também passou a trabalhar à noite e saíamos sempre juntos por volta das 20:30h, o que nos dava tempo de ir a shows, cinema ou jogos no Maracanã. Depois ainda veio um terceiro, o Antonio de Pádua, e agora os três saíamos pouco depois das 8:00 da noite. A coisa só pegava quando dava uma diferença para eu fechar o balancete e havia por exemplo um show com ingresso já comprado, aí era um pega pra capar, com todos os três fazendo de tudo para achar a diferença. Muitas vezes saíamos do banco antes que o pessoal que entrara ao meio dia. Me lembro de certa vez, que antes das 20:30hrs, já estávamos fora do banco sentados numa mesa de um bar, que ficava entre a Av. Rio Branco e a Visconde de Inhaúma, quando vimos o Ângelo, que era o chefe administrativo de todo o setor de câmbio ao qual nós pertencíamos, vindo de seu trabalho na Imprensa Nacional, localizada na Pça. Mauá. Quando ele chegou perto de nós o repreendemos veementemente, alegando que era por isso que o país não progredia, devido a moleza de funcionários que trabalhavam tão pouco. Angelo, pego de surpresa, se desculpou dizendo que aquele fora um dia excepcional. No outro dia quando chegamos para trabalhar, ele nos chamou até a sua sala e foi logo dizendo: - Vocês são muito abusados de me chamarem a atenção ontem à noite. - Eu como chefe do setor é que deveria chamar a atenção de vocês por já estarem aquela hora fora do banco. Nós respondemos em coro: - Antes de você nos jantar com bronca, nós preferimos te almoçar. Ao final tudo terminou bem, sem ressentimentos, pois ele sabia que não dependíamos do banco para sobreviver, por isto éramos assim insubordinados.

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