Quando era garoto, por causa de colégio morei numa cidade do interior do Estado do Rio de Janeiro , Carmo, que faz fronteira com o Estado de Minas Gerais, ocasião em que fiz o primário e o antigo ginásio, hoje segundo grau. Mas nas férias, não havia quem me segurasse, ia passar com os meus pais no Rio, naquela época uma cidade mais do que Maravilhosa. Uma das coisas que me dava bastante alegria nestas ocasiões de férias no esticado verão carioca, além das praias era soltar pipas. Eu e meus irmãos, eles muito mais adestrados que eu neste esporte, passávamos o dia inteiro soltando cafifa, um tipo de pipa, que pode embicar até quase ao chão a fim de cortar as outras pipas que estavam no alto. Assim, comprávamos um rolo de linha de número 10, que é bem forte, passávamos cerol na linha (hoje uma coisa corretamente proibida) e depois de feita a rabiola e envergada a cafifa com a linha do cabresto, íamos para um ponto estratégico, onde havia vento e começávamos a descarrilhar o rolo, com a nossa pipa subindo bem alto. Para dar mais ímpeto ou atiçar algum medroso, que não queria subir a sua pipa perto da nossa, ainda cantávamos um verso, mais ou menos assim: - tá com medo tambarél minha linha é de carretel. E íamos cruzando cafifa com cafifa, cortando algumas e as vezes aparando as pipa boiadas pela rabiola, trazendo-as até o nosso ponto. O ruim do entretenimento é que quando para se livrar de uma pipa que a gente sabia ser superior, que fora empinada por linha de nylon e possuía até pedaços de gilete, amarrados na rabiola ou tentar cortar uma outra que estava num ponto aquém da nossa, tínhamos que dar mais linha e o nosso rolo apesar de muitas jardas, chegava no final, sem nenhum outro por perto para emendar os fios, era o fim da linha e adeus a nossa pipa que era cortada por outra, normalmente aquela sinistra que a gente temia. A única coisa a fazer agora, era puxar rapidamente a nossa linha que tinha cerol, para não ser roubada quando passava em algum quintal onde havia garotos, que também soltavam pipas. Sim, o fim da linha que nos impossibilitava de sair vencedores no cruzamento de pipas nos deixava bem tristes. Hoje em sentido figurado, nas nossas vidas, as vezes vamos dando linha a nossa "pipa" para tentar fazer um cruzamento de ideias ou intercâmbio de relacionamentos com outras pessoas que estão como que com suas pipas no alto. Assim, damos linha aqui, tenteamos ali, embicamos acolá para que a nossa pipa possa ficar o maior tempo possível no ar e sempre perto de outras para um intercâmbio. Acontece que apesar de todo o vento favorável que nos arrasta para longe, quase fora do alcance de nossas vistas, chega uma hora, que não se pode ir além do que já fomos e não podemos alcançar outra pessoa que está num ponto mais distante pois a nossa linha acabou. Não dá para fazermos mais concessões, isto porque não temos mais de onde tirar qualquer suprimento extra, pois este se esgotou, foi todo consumido numa completa doação, aí é o fim de tudo, da "pipa" simbólica que pretendíamos disputar, só resta assistir o nosso fracasso, vendo a mesma boiar ao léu, sendo disputada por outras pessoas e como diz um ditado "pipa voada não tem dono". Sim, de uma certa forma a nossa linha de paciência se acabou, não nos resta mais nada, para emendar, ou adiar o desenlace, nos damos como por perdida a "pipa" que íamos cruzar e aparar, pois para nós chegou O FIM DA LINHA.
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