Quando garoto, estudei numa cidade do interior e havia em julho uma festa que durava uma semana. Nestas ocasiões, vinham muitos vendedores autônomos de fora e instalavam as suas barracas ao redor da praça central. Nestas barracas havia de tudo, desde comidas típicas a cachorros quentes, maçãs do amor, algodão doce, artesanatos, roupas e até as que eram chamadas barracas da sorte. Em algumas destas havia um coelho preso em uma caixa e depois solto pelo barraqueiro, que premiava aquele que havia escolhido o local onde o coelho fosse entrar; outras eram de tentar encaixar argolas em garrafas, que ficavam em cima de uma mesa. Como era criança, além de ser proibido participar de alguns sorteios e por ter pouco dinheiro, me contentava em ir nas barracas em que você comprava números escritos a caneta, dobrados em um pequeno papel que estavam dentro de um saco de pano. Era pagar, meter a mão no saco e tirar um papel para ver o que você ganhou. O prêmio era o correspondente ao número que estava escrito no papel e ficava exposto em prateleiras na aludida barraca. Assim, por várias vezes, imaginando tirar um daqueles bons prêmios expostos nas prateleiras, fui a estas barracas e nada. Só conseguia tirar grampos de cabelo, caixas de fósforo, pentes vagabundos, prêmios que valiam aproximadamente um décimo do valor que havia pago para tentar a sorte. Certa feita, quando tinha aproximadamente uns treze anos, fui a uma destas barracas e comprei o direito de enfiar a mão no saco para tentar ver o que seria o prêmio. Como sempre, me parece que foi um pente pequeno chamado "flamengo". Só que, após isto, fui para casa levando não só aquele "ótimo prêmio", como também o papelzinho com o número escrito a caneta. Vi que era um papel almaço com linhas azuis, cortado a tesoura em quadrados pequenos. Naquela época, meu tio possuía um armarinho que tinha papel idêntico, bem como a caneta usada para grafar o número, para ficar igual o do papel comprado. Assim, voltei à barraca e para não gerar qualquer desconfiança adquiri um novo direito de tentar a sorte, que na verdade não existia, mas passei a observar os prêmios expostos e o respectivo número. Vi o melhor prêmio que poderia ganhar, caso tirasse o seu número. Voltei para casa e já com os papéis almaço cortados na mesma disposição, comecei a procurar imitar o tipo de letra com o número do melhor prêmio. Depois de algumas tentativas, vi que havia conseguido fazer um semelhante. Assim à noite, quando o movimento era bem grande e acompanhado de quatro amigos, maiores e mais fortes, fui até a aludida barraca tentar ver se conseguia ganhar alguma coisa valiosa. Chegando lá, com aquele alvoroço todo, paguei o valor cobrado para o direito de tentar a sorte. Só que eu já tinha colocado entre os dedos de uma forma invisível, o papelzinho com o número desejado. Fiquei como que tentando apanhar um número no fundo do saco. Na verdade, o que eu estava fazendo era passar o número que estava entre meus dedos para a minha mão, sem pegar outro. Depois de alguns instantes, tirei o número e falei o número bem alto para todos ouvirem. As pessoas ali presentes, entre elas os meus amigos, quando viram que o número que eu gritara batera com o do best prêmio, não acreditavam no que estava acontecendo, só ouvi dizerem: - Caramba você acertou em cheio! O barraqueiro ficou boquiaberto, não sabendo, a princípio, o que dizer, dado a surpresa de que foi tomado, pois com certeza aquele número não havia sido colocado no saco. Passados os primeros instantes de incerteza e vendo o barraqueiro que não poderia dizer que aquele número não havia sido colocado, senão a multidão que comemorava comigo poderia até linchá-lo, com muita raiva ele começou a gritar: - Saiu, saiu o grande prêmio, saiu!!! - Olha o felizardo ganhador, apontando para mim e já me entregando o cobiçado prêmio. Ao fazê-lo vi no seu olhar aquele ódio mortal, cheio de pura raiva, como a dizer, você me paga seu moleque espertinho, mas se conteve. Fui para casa imediatamente com o grande prêmio e só voltei de novo a praça quando a festa já havia acabado e os barraqueiros ido embora. Naquela época pensei: pra esperto, esperto e meio. Hoje não faria mais isto, nem me aproximaria das barracas ou outros locais que lhe oferecem a oportunidade de tentar a sorte que não acredito... Foram coisas de criança, sem a devida instrução, mas fazer o que agora, apenas lembrar as minhas peripécias de moleque!!!
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