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sábado, 27 de novembro de 2010

O HOMEM QUE NÃO SABIA FAZER CONTAS


Nos primeiros anos da entrada em vigor da Lei do Divórcio, fui procurado por um cliente que desejava fazê-lo com base no lapso de tempo de separação. Eu estava patrocinando, assim, o cônjuge varão, que ficou de arranjar as testemunhas para serem arroladas e ouvidas, o que foi providenciado. Na audiência designada, as partes e seus advogados estavam presentes, mas nada das testemunhas chegarem. Como a hora da audiência já havia passado e as testemunhas arroladas não apareciam, o advogado da outra parte viu passando no corredor do Fórum, um conhecido acompanhado de um amigo. Chamou-os para ver se poderiam ficar como testemunhas para comprovar que o casal  já estava separado  há  mais  de dois anos, o que era um fato verdadeiro. Apresentações feitas e pontos controvertidos explicados, as testemunhas e o cônjuge varão encontraram um ponto em comum, que é de gostarem e de jogarem futebol, entabulando-se que  foi  nesta condição que se conheceram num clube e ficaram sabendo da separação. O pregão foi feito alguns minutos após a conversa das testemunhas com o cônjuge virago. Depois da tentativa do Juiz de uma reconciliação e como esta não foi conseguida, passou-se a ouvir as testemunhas substitutas. Assim, a primeira testemunha a ser ouvida foi o amigo do conhecido do advogado e esta  como não  disse que conhecia o casal  há muito tempo, apenas o necessário, não foi muito pressionado  pelo Juiz, nem pelo promotor. A segunda, inquirida, disse que conhecia o varão há mais de dez anos. Fiquei preocupado quando ele alegou tal período tão longo. Aí, o Juiz começou a indagar da testemunha para que ela  fornecesse  elementos de que realmente conhecia o cônjuge varão há tanto tempo. Ela insistia de que tal amizade havia surgido em conversas após os jogos, entre uma cerveja e outra. Isto não satisfazia ao Juiz, que a re-inqueria para que a testemunha fixasse uma data em que começou a amizade de ambos. E a testemunha continuava com suas evasivas alegações, de conversas entre um chopinho e outro, que em  nada respondiam as perguntas feitas. As perguntas passaram a ser mais escrutinadoras e a  testemunha, cada vez mais embaraçada, ficando numa verdadeira saia justa. Não sabendo mais o que  perguntar, o Juiz me passou a palavra para inquirir a testemunha, já que era o advogado do ex-marido que se encarregara de arrolá-la. Como eu havia notado que o ponto comum entre eles era o futebol, então indaguei da testemunha se ele conhecera o cônjuge varão por ocasião das comemorações da conquista do tri-campeonato mundial em 1970. Ora, nós estávamos em 1980, conta fácil, era só pegar a deixa. A testemunha responde enfaticamente: - Não. A minha amizade com o marido aconteceu muitos anos depois da copa de 1970. Com isto, o Juiz viu que a testemunha, além de imprestável, não sabia fazer contas.  Mesmo assim, baseado no depoimento da primeira testemunha e outras provas, o Juiz decretou o divórcio do casal.  Hoje já não precisa fazer qualquer prova do lapso de tempo de separação para se pedir o divórcio. Ora direis, ouvir testemunha falsa é crime, não tenho dúvidas, mas é perdoável quando não há nenhum dano envolvido e foi apenas uma formalidade, que nem é mais necessária, mas não saber fazer as operações básicas de somar ou diminuir deveria  dar cadeia para um homem tão asno.

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