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terça-feira, 30 de novembro de 2010

UMA DÚVIDA ATROZ


Quando garoto não tive uma infância privilegiada, no sentido de ganhar muitos presentes. Poucas foram as vezes em que ganhei brinquedos bons, daqueles de encher e brilhar os olhos de qualquer criança. Na maioria das vezes eram mais coisas necessárias, tais como roupas, sapatos, no máximo uma bola ou algum caminhão de madeira, feito pelas mãos habilidosas de meu pai. Eu compreendia as suas dificuldades e jamais reclamei de não ter aquilo que sonhava. Certo dia, minha mãe recebeu um comunicado de que sua irmã e seu cunhado, donos de um grande armarinho numa cidade fronteiriça com Minas Gerais iriam vir ao Rio para  fazer compras nas ruas da atual Saara e que precisavam de um garoto para ajudá-los no vai e vem dos embrulhos até o seu carro. Fui designado, então, para esta tarefa. Assim, de manhã, eles  passaram por nossa casa e fomos direto para aquelas já movimentadas ruas, estacionando ele o carro, uma brilhante Plymouth preta, na Rua Gonçalves Ledo. Começou-se, então, um eterno vai e vem entre as lojas e o local onde estava o veículo. Eram sacolas enormes, entulhadas de tecidos, roupas e muitas quinquilharias, que quase me faziam sumir debaixo delas. Na hora do almoço, paramos para comer não em restaurantes, mas em pé nos famosos pés sujos, algumas esfihas e quibes porque o meu tio emprestado era natural do Líbano e como tal apreciava essas coisas, ainda mais que eram baratas e também tinham como brinde os refrescos grátis. Já era bem tarde, o carro estava abarrotado de compras e eu bem cansado por tantas idas e vindas, quando ele anunciou o fim das compras e parando numa loja  infantil me fez a proposta de um presente. Fiquei na expectativa de realizar, pelo menos uma vez na vida, o sonho de ter algum bom brinquedo. Então ele disse de supetão: - O que você quer? - UMA MEIA OU UM LENÇO? Fiquei numa dúvida atroz e pensei, ... - qual é o pior? Não cheguei a conclusão, o jeito foi dizer-lhe que não precisava se preocupar, podia deixar para lá. Parece que por causa da minha incerteza quanto ao que ganhar de presente, ele próprio fez a escolha e me deu. Não me lembro hoje com que eu fui premiado, por aquele dia de tantas sacolas pesadas, que eu levava quase que arrastando pela Rua da Alfândega, dado por aquele tio mui amigo e mão aberta.     .

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

TAMANHO É DOCUMENTO


Ao ver e ouvir os tristes relatos  que  aconteceram  no  Rio, com a onda de arrastões, queima de veículos e a invasão policial/militar na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão, me vem a lembrança de fatos que se passaram na minha juventude, perto desses locais. Certa madrugada, quando eu vinha de uma festa, em um lotação, atual micro-ônibus, abarrotado de adultos e crianças, fomos parados numa blitz pelo pessoal da invernada de Olaria. Havia um grande cerco policial naquela área, porque há alguns dias atrás, o inexpressivo bandido "Cara de Cavalo"  havia matado o famoso detetive Le Cocque, um dos homens de ouro da polícia, assim como o Detetive Perpétuo, Mariel Mariscot e outros. Naquela época, bandido tinha o maior medo e respeito por policial, ainda mais por tais homens e não havia enfrentamento como há hoje. Depois de várias discussões entre policiais e o motorista do lotação, um policial que estava dentro do veículo gritou para todos ouvirem:  - Olha aí, vai todo mundo para a Delegacia. - Quem não tiver documentos vai passar a noite na cadeia. Naquela ocasião, eu estava na companhia de um colega, estudante do colégio militar, mas eu mesmo não estudava, nem trabalhava, vivia apenas de música, tocando saxofone num conjunto de bossa nova, sem possuir documentos de tal atividade, que era a Carteira da Ordem dos Músicos. Fiquei assim, preocupado com a possibilidade de ficar preso. Então, ouvi certas mulheres reclamando de que havia crianças no veículo e que não era justo elas irem de madrugada parar em tal lugar. Diante dos inúmeros pedidos, o tal policial que havia dado a ordem, resolveu ceder e disse finalizando: - Tudo bem, podem descer mas somente as mulheres e as crianças. Vi então uma brecha, pois além do tamanho, não aparentava  ter mais que treze anos. Então,  me abaixei   mais  um  pouco e segurando de leve na barra da saia de uma mulher que ia na minha frente, fui andando no seu encalço, quase colado ao seu corpo, como se fôssemos uma pessoa, só que ela nada percebeu, pois o veículo mais parecia umas sardinhas em lata, de tantas pessoas que levava em pé, naquela madrugada. Assim passei pelo policial, que estava fiscalizando a saída das pessoas, num dos degraus do micro-ônibus, sem nenhum obstáculo. Já na rua, fiquei dando tchauzinho para o meu colega e futuro cadete que continuou no lotação e depois me contou que mesmo com documentos, passou um aperto na Delegacia. É ...TAMANHO É DOCUMENTO

sábado, 27 de novembro de 2010

O HOMEM QUE NÃO SABIA FAZER CONTAS


Nos primeiros anos da entrada em vigor da Lei do Divórcio, fui procurado por um cliente que desejava fazê-lo com base no lapso de tempo de separação. Eu estava patrocinando, assim, o cônjuge varão, que ficou de arranjar as testemunhas para serem arroladas e ouvidas, o que foi providenciado. Na audiência designada, as partes e seus advogados estavam presentes, mas nada das testemunhas chegarem. Como a hora da audiência já havia passado e as testemunhas arroladas não apareciam, o advogado da outra parte viu passando no corredor do Fórum, um conhecido acompanhado de um amigo. Chamou-os para ver se poderiam ficar como testemunhas para comprovar que o casal  já estava separado  há  mais  de dois anos, o que era um fato verdadeiro. Apresentações feitas e pontos controvertidos explicados, as testemunhas e o cônjuge varão encontraram um ponto em comum, que é de gostarem e de jogarem futebol, entabulando-se que  foi  nesta condição que se conheceram num clube e ficaram sabendo da separação. O pregão foi feito alguns minutos após a conversa das testemunhas com o cônjuge virago. Depois da tentativa do Juiz de uma reconciliação e como esta não foi conseguida, passou-se a ouvir as testemunhas substitutas. Assim, a primeira testemunha a ser ouvida foi o amigo do conhecido do advogado e esta  como não  disse que conhecia o casal  há muito tempo, apenas o necessário, não foi muito pressionado  pelo Juiz, nem pelo promotor. A segunda, inquirida, disse que conhecia o varão há mais de dez anos. Fiquei preocupado quando ele alegou tal período tão longo. Aí, o Juiz começou a indagar da testemunha para que ela  fornecesse  elementos de que realmente conhecia o cônjuge varão há tanto tempo. Ela insistia de que tal amizade havia surgido em conversas após os jogos, entre uma cerveja e outra. Isto não satisfazia ao Juiz, que a re-inqueria para que a testemunha fixasse uma data em que começou a amizade de ambos. E a testemunha continuava com suas evasivas alegações, de conversas entre um chopinho e outro, que em  nada respondiam as perguntas feitas. As perguntas passaram a ser mais escrutinadoras e a  testemunha, cada vez mais embaraçada, ficando numa verdadeira saia justa. Não sabendo mais o que  perguntar, o Juiz me passou a palavra para inquirir a testemunha, já que era o advogado do ex-marido que se encarregara de arrolá-la. Como eu havia notado que o ponto comum entre eles era o futebol, então indaguei da testemunha se ele conhecera o cônjuge varão por ocasião das comemorações da conquista do tri-campeonato mundial em 1970. Ora, nós estávamos em 1980, conta fácil, era só pegar a deixa. A testemunha responde enfaticamente: - Não. A minha amizade com o marido aconteceu muitos anos depois da copa de 1970. Com isto, o Juiz viu que a testemunha, além de imprestável, não sabia fazer contas.  Mesmo assim, baseado no depoimento da primeira testemunha e outras provas, o Juiz decretou o divórcio do casal.  Hoje já não precisa fazer qualquer prova do lapso de tempo de separação para se pedir o divórcio. Ora direis, ouvir testemunha falsa é crime, não tenho dúvidas, mas é perdoável quando não há nenhum dano envolvido e foi apenas uma formalidade, que nem é mais necessária, mas não saber fazer as operações básicas de somar ou diminuir deveria  dar cadeia para um homem tão asno.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A MULHER QUE PARAVA O TRÂNSITO


Não muito tempo atrás, recebi um telefonema de um amigo de infância me convidando  para um almoço de confraternização dos que fizeram parte da juventude dos anos sessenta em uma simpática rua sem saída, num subúrbio do Rio. Na data marcada, desci a serra acompanhado de um filho e nora para reencontrar velhos companheiros que eu já não via há quase quarenta anos. Aquela reunião, aquela rua onde eu havia passado parte da minha adolescência, me remeteram para aqueles anos felizes, cheios de sonhos de uma juventude que acreditava poder mudar o mundo, com uma nova filosofia de vida. Depois de conversar com todos, pondo os nossos assuntos em dia, o anfitrião que havia me ligado, o Carlinhos "Leiteiro", numa certa hora, se aproximou da minha mesa quando não havia nenhuma mulher nela e disse: - Vou te contar um segredo de quase quarenta anos atrás. Fiquei curioso e apreensivo, pensando: O que terá este  amigo guardado há tanto tempo? E ele acrescentou: - Se lembra da vez que você deixou o MG comigo, para eu levar pro meu quartel a fim de efetuar um reparo no carburador?  Eu disse que não me lembrava do fato. Prosseguindo ele disse: - Pois é, eu levei o MG pro meu quartel porque havia lá um mecânico muito bom e que realmente deu um jeito no motor do veículo. Em continuação ele disse: - Aí, à noite, quando vinha trazendo o carro para lhe entregar eu percebi no meio do caminho que havia uma fila de carros, que quase paravam e depois prosseguiam. Fiquei curioso, pois não era nenhum engarrafamento. Ao chegar mais perto do ponto onde havia a diminuição de velocidade, vi que a causa disto era uma linda mulher, parada no ponto de ônibus e que causava um alvoroço nos motoristas, que lhe ofereciam carona insistentemente e ela nada. Ao ficar do lado dela e para não ser diferente, lhe ofereci carona também. Ela, ao ver aquele carro conversível amarelo de rodas raiadas, com capota arriada e volante do lado contrário, não titubeou  nem se fez de rogada, foi logo abrindo a porta e se sentando ao meu lado, me fazendo sentir o rei da cocada. Depois das apresentações e alguns papos furados, ela me disse: - Eu gostaria de dirigir este carro. Aí eu fiquei super-preocupado, pois sabia do seu ciúme por ele, mas como a mulher era muito linda, daquelas mesmo de fechar o trânsito, não tive muita força para negar o seu pedido. Antes, porém, procurei uma rua deserta e sem saída em que as chances dela de fazer qualquer bobagem eram mínimas. Localizada a rua, passei as informações das marchas do veículo e de como ela deveria se portar com a direção do lado contrário, como são todos os carros ingleses. Instruções dadas e repetidas, com muitas recomendações, lhe passei a direção e ela saiu em disparada com aquele bólide. Tudo ia bem até chegar ao final da rua, quando ela teve de efetuar a marcha-ré e com toda força ela enfiou a traseira do carro num muro, quase o derrubando. Fiquei estarrecido, não acreditando no que meus olhos viam. O MG estava com a traseira toda amassada. Ela tentou dar algumas explicações, mas eu não a ouvia.  A minha decisão de imediato foi mandá-la embora, pois da forma como aconteceu o acidente, pensei que ela nem deveria ter carteira de habilitação e aí a coisa ficaria mais complicada. Passados os primeiros momentos de terror, vi que o motor ainda estava funcionando e que as rodas, apesar do impacto, não estavam travadas. Assim, saí como um louco daquele local e fui atrás  do Tião "Nove", lanterneiro muito bom, que você deve se lembrar. Aquiesci que sim, com a cabeça. E continuou: - Então localizado o Tião "Nove", supliquei-lhe que trabalhasse a noite toda para consertar o carro. Daí, fui para casa de condução e te procurei dizendo que o carro ainda apresentava problemas de motor, razão porque ficara no quartel, você disse tudo bem sem desconfiar de nada. No outro dia, fui a  oficina  e o  carro  já  estava todo desamassado, sem nenhuma protuberância em sua lataria. O Tião "Nove" era mesmo um martelinho de ouro. Então, fui a São Cristóvão e na Rua Escobar encontrei e comprei as lanternas e a tinta para pintá-lo. À noite, lhe entreguei o veículo sem nenhuma aparência do dano causado por aquela linda, mas desastrada mulher, que se eu pudesse, na ocasião  dos  fatos, teria enforcado de tanta raiva que eu fiquei. Só te conto este episódio agora, por que já se passaram tantos anos e você nem mais possui o MG. Te peço desculpas atrasadas pelo acontecido. Desculpas aceitas, pensei: aquele carrinho ainda me surpreende com fatos que eu nem sabia. É, ele teve histórias .        

sábado, 20 de novembro de 2010

O DIA QUE O CATADOR SACIOU A SUA FOME


Era ainda o verão que começara em mil novecentos e sessenta e nove. Minha mãe havia acordado cedo e estava nos preparativos para o almoço quando, de repente, alguém grita no muro da casa ao lado, num subúrbio do Rio: - Dona Liana, dona Liana. Minha mãe deixa os afazeres na cozinha e sobe até a parte do muro de onde vinha a voz e encontra-se com a Didi, filha da dona Carmelita, que lhe informa que os vizinhos estavam se cotizando para fazerem comida para dar pro seu Olímpio, um catador de lixo que morava próximo, estava desnutrido e precisava de um alimento forte para se restabelecer. Minha mãe concordou em dar algumas coisas, vindo buscar algo em nossa cozinha, ocasião em que me informou dos fatos. Depois disto, me aprontei e parti para a faculdade e depois para o trabalho, tendo retornado quase as 23:00 horas e soube da notícia. Seu Olímpio havia falecido. Após comer mocotó no almoço passou mal e foi levado as pressas para o Hospital Getúlio Vargas, onde ocorreu o óbito. Uma tristeza. Soube então de todo o ocorrido. No dia anterior, ele foi a um posto do SAMDU para ser examinado, devido a uma fraqueza que até o impedia de caminhar. O médico que o atendeu disse para o acompanhante que o mal dele era apenas desnutrição e que ele precisava ser bem alimentado. Daí, alguns vizinhos inexperientes resolveram fazer um mocotó para fortalecê-lo, o que foi demais para quem passara tanta privação alimentar. A vaquinha agora era para fazer o seu funeral. Da história acima, tirei duas conclusões. Primeiro: que muitas vezes fazemos coisas pensando que estamos fazendo um bem, quando na verdade estamos fazendo um grande mal. Segundo: quando temos privação de algo por muito tempo, não se pode de uma hora para outra compensar toda a carência, pois pode ser fatal. A vida é assim mesmo, às vezes passamos várias privações e quando obtemos algo para supri-la, temos de ter equilíbrio e não exagerar na dose. No caso do catador foi isto que ocorreu e a única coisa boa que lhe aconteceu foi que morreu de barriga cheia, satisfeito, coisa que não acontecia há muito tempo. Dizem que morrer de fome é uma morte muito cruel, dolorida e cheia de alucinações, onde o moribundo se vê salivando, comendo muitos pratos apetitosos de encher os olhos. Fico eu remoendo as minhas recordações de um tempo em que a vida apesar de algumas histórias tristes, como a do catador seu Olímpio, era muito boa para mim. É, mas O SONHO ACABOU.... fui na padaria e até la não tinha mais sonho.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A PULSEIRA CRIADORA DE CASO








É muito conhecida a estória do marido que ao chegar em casa encontra sua esposa o traindo no sofá da sala e por conta disto, decide vender tal sofá por ver nele o pomo da discórdia familiar. De vez quando, nós somos partícipes e testemunhas de fatos com uma certa similaridade. Vamos então a minha estória. Na condição de advogado, fui procurado por um cliente que havia apresentado uma queixa-crime contra uma pessoa que havia lhe feito ameaças. Na audiência de conciliação no Juizado Especial Criminal (JECRIM), estavam lá presentes meu cliente (a vítima), o acusado (o marido) e sua esposa (o pivô dos fatos). Indagado, o marido alegou que havia feito tais ameaças a fim de que meu cliente parasse de assediar sua esposa, seja por cartas ou por telefonemas. As partes foram instadas pelo conciliador a agirem de modo civilizado, aconselhando para que meu cliente se abstivesse de dar em cima da mulher do acusado e este parasse de ameaçar meu cliente. Conciliação aceita nestes termos, o marido virou-se para a mulher e disse: - Agora você devolve a pulseira de ouro que ele te deu. Ela, prontamente sacou da bolsa uma pulseirinha e entregou ao seu marido que tentou repassar para o meu cliente, o "Ricardão". Este não quis receber o objeto e disse: - O que eu dei está dado, não quero de volta. Aí ficou um impasse impedindo o acordo e um grande mal-estar pairou no ar. Não vendo outra solução, eu disse: - Me dá esta pulseira e em ato contínuo peguei e coloquei-a  no  bolso, para alegria do conciliador e alívio das partes e o acordo foi firmado. Enquanto assinávamos o acordo do  bom viver, eu remexia o bolso, apalpando a pulseira pra lá e pra cá e falava com os meus botões: - que pulseirinha briguenta e arranjadora de caso, quase que você põe tudo a perder. Depois disto, fui pro escritório e dei a tal pulseira para a  minha secretária, mas a alertei do perigo de ter um objeto "tão perigoso".  É, muitas vezes atribuímos a alguma coisa inanimada a causa da pertubação e da paz quando, na verdade, são os nossos atos ou o que outras pessoas fazem que causam tais problemas e não este ou aquele objeto. Portanto, devemos repensar nossas atitudes antes de agirmos como néscios, culpando algo que não tem nada a ver.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

A ERA DO RÁDIO NO INTERIOR







Quando garoto o que me fazia parar de brincar era ao cair da tarde, as novelas transmitidas pelo rádio, do Anjo e depois a do Jerônimo, o Herói do Sertão. Era bala para todo o lado. Cuidado Jerôoonimo! Gritava o Moleque Saci. Também gostava muito de ouvir os programas de auditório, Manoel Barcelos, Paulo Gracindo e, aos sábados, o patrocinado pelas pastilhas Valda. Depois do Rádio ligado, não saía do César de Alencar. Domingo sempre foi um dia ruim em termos musicais, nada havia para se ouvir a não ser o programa de calouros a Hora do Pato, em que Amilton Valim, mesmo sem enxergar, acompanhava ao piano e dava o sinal para a gravação do Moleque Saci (Cauê Filho) brecar os candidatos ruins com o seu quá...quá...quá... O que faltava em música sobrava em vibração à tarde na narração dos jogos de futebol. Os jogos eram uma eterna empolgação na voz do Cozzi e do Curi. Todos queriam ver a roseira do Longras balançar. Era pimba pra todo o lado. A televisão fez a gente ver que a bola não corria tanto como no rádio, uma monotonia às vezes. Bons tempos em que a noite ficávamos ouvindo grandes novelas, como Direito de Nascer, a Hora Sertaneja e programas como Espetáculos Orniex, Tancredo e Trancado e a inesquecível PRK 30. Havia as deliciosas brigas musicais entre Ataulfo Alves e Mirabeau de Oliveira, cada um querendo justificar porque a morena foi embora. Pois é, em vez de duplas tínhamos trios musicais, Iraquitam, Nagô e outros. Todos queriam saber onde o vento escondeu o seu amor. Do Caribe vinha o som contagiante dos mambos e das rumbas, fazendo a gente querer aprender a tocar bongô ou maracas para fazer o acompanhamento. Lembro-me bem de um circo que ficou por um bom período de tempo na cidade e um garoto da trupe, irmão de uma rumbeira, passou a estudar na minha turma no Francisco Varella. Fiz amizade com ele só para poder assistir os ensaios de sua irmã. A vida ia sem pressa, como aquela Maria Fumaça que cortava a estação lá em Bacelar, bem distante da cidade. Tudo isto foi atropelado em 1957 por uma notícia vinda de Baikonur, na voz do locutor do Repórter Esso, de que a Rússia tinha lançado no espaço o seu Sputinik que dava uma volta em torno da terra a cada 80 minutos. Foi o início do fim de um período do rádio ingênuo. Dali para frente a nossa imaginação seria posta de lado pelas coisas vistas. O tempo passou a voar nas asas da boa programação das Rádios, ainda AM, como a JB e as paradas das cores e dos bairros da Rádio Tamoio. Isto porque, pra quem é jovem e tem pressa Hoje é Dia de Rock. Nada mais seria como antes, através das ondas curtas, médias e longas de uma rádio cheia de interferências que fizeram as nossas cabeças e encheram os nossos corações de felicidade.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A RELAÇÃO CUSTO/BENEFÍCIO


Todos os dias somos bombardeados pela mídia no sentido de adquirirmos algum item recém-lançado ou somos induzidos a crer que para sermos felizes precisamos de tal produto. No apelo consumista, os engenhosos publicitários colocam pessoas lindas em ambientes super agradáveis, fazendo a merchandising do produto de tal forma que é difícil resistir a tentação, pois enchem nossos olhos de desejo de obtê-lo. Como as tendências são cada vez mais curtas, em pouco tempo o aparelho que  é de última geração se torna rapidamente obsoleto, assim foi com a TV colorida, depois de PLASMA, LCD, LED, 3D, de 29", 32", 42" 46" e 50" polegadas, o que nos leva a uma roda frenética na ânsia de acompanhar a moda. Já vai longe o tempo em que as bolachas de vinil, os LPs, ficaram décadas no cenário fonográfico.Quase tudo é vendido sem entrada, mas muitas vezes ao adquirirmos algo assim ficamos sem saída. Temos de fazer uma avaliação criteriosa da necessidade real de alguma coisa e quais os seus custos e benefícios. Devemos nos lembrar que A FELICIDADE NÃO PODE SER COMPRADA, MAS A INFELICIDADE SIM. Em tudo na vida existe a relação do binômio custo/ benefício. Não se pode ter algo sem arcar com o seu custo. Infelizmente, na maioria das vezes, nós só olhamos os benefícios sem atentarmos para o verdadeiro custo. Esta visão desfocada da realidade onde só se vê os benefícios sem levar em conta o preço que se paga, também está presente no relacionamento humano, onde uma linda mulher ou um belo rapaz são alvos de cobiça e desejos, que quando consumados, põem o seu investidor, aquele que paga pra ver, em situação bastante deplorável. E aí quase sempre já é tarde, pois ao terminar a fase de encantamento, verifica-se que o embrulho era lindo, mas o conteúdo imprestável, não valia nada. Conta-se que certo homem estava com um lixo repugnante em sua casa e por diversas vezes o colocara na rua para que os lixeiros o levassem e nada, o lixo sempre permanecia na frente da casa e a cada dia se tornava mais insuportável. Então o homem teve uma ideia. Depois de jogar algum desinfetante, embrulhou-o num papel muito bonito e qual não foi a sua surpresa que, antes dos lixeiros passarem, alguém já o havia levado. Sim, às vezes, compramos algo por conta do embrulho e não do conteúdo. Na relação humana muitas vezes o que era  um adocicado meu bem, meu bem, se transforma num áspero meus bens, meus bens. Sempre por detrás de uma apetitosa isca, há um mortífero anzol. Todo o relacionamento baseado apenas na beleza externa tem vida curta, pois a beleza logo se desvanece e o PITELZINHO DE HOJE É A BARANGA OU O BAGULHO BARRIGUDO DE AMANHÃ. Aquela voz melosa e adocicada, cheia de charme de hoje, pode se transformar numa voz rascante, ácida, que você não suportará mais ouvir. Lembre-se: um produto pode ser descartado rápido, enquanto que um relacionamento é mais complicado e sempre traz muitas dores. Certa vez mostrei a um pequeno garoto uma reluzente bola de gude e uma pedra de diamante e perguntei: - Qual delas você quer? Ele não titubeou, rapidamente escolheu e ganhou a bola de gude. Quando somos infantis fazemos escolhas a base da visão e esta, quase sempre, nos engana pois, como bem o disse o escritor do Pequeno Príncipe, O ESSENCIAL É INVISÍVEL AOS OLHOS. Portanto, antes de comprar ou investir em alguém faça uma avaliação correta, veja o que há por trás de sua beleza física, que passa rapidamente para não ser alvo de uma isca, que depois de mordida não perdoa, mata os inexperientes e incautos.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

QUAL É O SEU DIFERENCIAL?

De repente me vem a lembrança um engraxate que havia na Travessa Arco dos Teles, na Praça XV no Centro do Rio, bem perto do ancoradouro das barcas que fazem a travessia do Rio a Niterói. Ele e mais três colegas possuíam suas cadeiras localizadas quase no final da aludida travessa, atendendo a vários clientes, entre os quais havia muitos Operadores da BV (Bolsa de Valores) que ainda existia no Rio e eu e mais uns colegas que trabalhávamos num Cartório de Protesto de Títulos, localizado na mesma praça. O engraxate, objeto das minhas recordações, era uma pessoa singular. Não permitia que a pessoa fosse logo sentando em sua cadeira. Havia um ritual na base do apito. Assim, com um apito curto, o cliente subia, mas ficava em pé na cadeira, só quando ele dava dois apitos é que poderia sentar-se para ele começar o seu trabalho. Enquanto os demais engraxates ficavam parados sem nenhum cliente para atender, para o nosso personagem havia uma fila de pelo menos quatro esperando a vez. Era também uma pessoa temperamental. Se alguém sentasse em sua cadeira com os sapatos sujos de lama ou de qualquer outra grande impureza, ele se recusava a engraxá-lo e gritava em alto e bom som: - SE ARRANCA ASSOMBRAÇÃO! Assim sobrava algum trabalho para os demais engraxates, que ficavam o tempo todo espantando moscas com o estalar de suas barulhentas flanelas. Ele era um botafoguense doente e quando o alvinegro vencia algum clássico ou partida decisiva, nós torcedores da estrela solitária, tínhamos os nossos sapatos engraxados de graça, por conta de tal vitória. Sim, o nosso personagem possuía um diferencial que o distinguia dos demais, mesmo que fosse num trabalho aparentemente inexpressivo. Na nossa vida, também temos de ter um diferencial que nos distinga das demais pessoas da mesma profissão ou daquilo que vendemos ou anunciamos. Assim, ao invés de copiar outras pessoas que já se deram bem em suas atividades, procure ter algo seu, único, como uma marca que o identifique de pronto. Veja em que você tenha algum dom ou habilidade, naquilo que você faz de melhor e aprimore ao máximo as suas habilidades, no seu dom dado por Deus, com isto você fará coisas que outros não farão igual. Não precisa ser algo espetacular ou inusitado, coisas simples as vezes tem um apelo maior. Concluindo, independente da atividade que você exerça, com certeza você pode ter o seu diferencial, só basta descobrir qual é, e ao descobri-lo, empenhe-se de toda a alma nele e sem sombra de dúvidas você colherá os frutos na época devida.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

MUDANÇAS


Nasci quando o mundo ocidental comemorava o fim da segunda guerra mundial. O sonho de liberdade do jugo, da opressão e de qualquer tirania parece ter me afetado desde o início. Cresci disposto a me rebelar contra tudo e todos que interferissem ou tentassem cercear de alguma forma o comportamento humano. Por isto, desde cedo, quando o mundo ainda não era uma aldeia global, procurei me inteirar e agir para que pudesse demonstrar o meu inconformismo com o que era estabelecido, a fim de que vivesse num mundo melhor, mais justo e mais livre. Assim, passei a ler, ouvir e assimilar tudo o que era novo e não convencional, a vanguarda em todos os campos. O pós-guerra trouxe consigo a rebeldia entre os jovens e eu como tal, os apoiava. James Dean foi a imagem completa desta forma de viver, seguido na música pelo modo irreverente de cantar de Elvis e outros. Ao findar a década de cinquenta, havia latente várias teorias em ebulição do que seria a década seguinte: existencialismo, humanismo, anarquismo e sonhos de liberdade. A partir de 1960, tais teorias foram colocadas em prática. Quando surgiu o movimento hippie da geração paz e amor, em que se buscava uma alternativa de vida, sem preconceitos de qualquer espécie, abracei tal movimento por achar que aí estava um caminho. Era hippie não nas roupas, mas no modo de pensar, tendo por base os versos ácidos de Allens Ginsberg, as músicas de protesto de Bob Dylan e Joan Baez, pensadores existencialistas, como Bertrand Russel, Jean-Paul Sartre, Aldous Huxley e um contestador do sonho americano de riqueza, Hebert Marcuse. Depois de um bom período, constatei que tudo o que é humano e segue a orientação de alguém que aparentemente parece estar à frente do seu tempo, pode às vezes, causar frustração ou mesmo decepção. Vi que a liberdade apresentada não passava de uma ilusão e falsidade, pois na verdade tornava as pessoas escravas de vícios e de uma vida vazia, sem nenhuma perspectiva de um futuro feliz que eu sempre almejei. Constatei que os meus heróis e mestres não eram feitos de ouro e sim de barro, possuíam algumas qualidades natas que os distinguiam dos demais, mas não os isentavam das fraquezas e erros inerentes a todos os humanos. A política, com suas várias formas de governo, só trazia o que era mau para os subordinados. Mesmo os mais radicais que derrubavam a força os péssimos ditadores e prometiam melhoras para todo o povo, quando instalados no poder, faziam as mesmas coisas ou piores do que seu antecessor, fazendo valer o ditado de que "o poder corrompe". Por isto resolvi fazer MUDANÇAS. E que mudanças! Foi como dar uma guinada de 180º graus em minha vida. Não mais me rebelei por rebelar e aceitei de bom agrado ser obediente, pois reconheci que sou um ser criado e não o Criador e portanto dependente Deste. Qualquer atitude contrária seria tolice das minha parte, um esforço para alcançar o vento. Passei então daquele jovem rebelde e agitado incendiário que queria mudanças a qualquer custo para um pessoa tranquila, até mesmo tentando apagar todos os focos de rebeldia que ainda existia dentro de mim, que não levam a nada e sim a decepção e que seguir os grandes agitadores, fazem de você apenas um marionete em suas mãos, levados por correntes filosóficas pra lá e pra cá, como as ondas de mar e que não levam a porto algum já que são pensamentos humanos que apenas arranham a tentativa de descobrir o objetivo e o caminho da verdadeira vida, quando ele está bem perto de nós e é fornecido de graça, basta sermos humildes e aceitarmos de bom agrado a ajuda que nos oferecem para alcança-lo e isto todas as semanas em nossas próprias casas, no horário mais adequado para atender as nossas conveniências. Ora, tu me dirás e aquele sonho de liberdade, de uma vida sem opressão, livre da tirania e do jugo da escravidão, desapareceram? Muito pelo contrário ainda permanecem vivos e presentes em minha vida. Apenas os direcionei para o caminho correto onde pudesse alcança-lo e não fosse apenas um sonho difícil de alcançar. As mudanças que eu sempre sonhei de um governo justo, onde haja igualdade e oportunidade para todos EXISTE e é possível, já estão bem a nossa frente mas não é de origem humana mas sim da parte do nosso Criador, através do seu governo que nós pedimos na oração do Pai Nosso, venha o teu reino, ou o seu governo, o qual satisfará todos os desejos humanos, inclusive a tão sonhada liberdade. Com certeza eu gostaria de estar lá junto com todos os meus amigos para aí sim, dizermos que somos verdadeiramente livres mas antes temos de estar dispostos a fazer MUDANÇAS.