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segunda-feira, 25 de março de 2013

MEU SAUDOSO PÉ DE JABUTICABA

Durante parte de minha infância, vivi em uma cidade do interior do Estado do Rio, Carmo, que praticamente faz fronteira com Minas Gerais. Era e é uma cidade muito quente. Por conta disto havia muitas árvores próprias da mata atlântica que gostam de uma temperatura assim elevada, tais como mangueiras, goiabeiras, jaqueiras, pitangueiras e outras. Havia uma que me chamava atenção por volta do início do mês de novembro, era uma enorme jabuticabeira. Ela ficava nos fundo de um quintal baldio, perto da casa da minha tia onde eu ficava. Era uma árvore antiga e bem alta, que depois da floração no início da primavera se enchia de frutas pretas aglomeradas em seu tronco, quais cachos de uvas. Ver tal arvore pontilhada de frutos pretos, enchia meu olhos de menino travesso e louco para provar o seu gosto. Assim, nestas ocasiões depois dos deveres escolares e outros compromissos na casa, subia nas grimpas de tal árvore, passando a escolher a princípio as jabuticabas maiores, que tinham dois caroços. Estas frutinhas maiores, eu e meus colegas de peraltices, chamávamos de "olho-de-boi", cujo gosto não era tão bom como as frutas menores. Passávamos horas comendo estas frutas e só descíamos, quando já estávamos empanturrados de as comer até os caroços. No dia seguinte, ficávamos amuados, pois estávamos "entupidos" por tantas cascas e caroços engolidos. O jeito era ir até o prático da farmácia local pedir um remédio para o caso. Depois de contarmos o que sentíamos, ele nos receitava e até preparava um poderoso laxante, à base de óleo de rícino, que era tomado ali mesmo com muita cara feia e repugnância. Mas alguns dias à frente quando a prisão de ventre já havia passado e o gosto ruim daquele óleo esquecido, lá estávamos de novo, naquele convidativo e apetitoso pé de jabuticaba, tendo agora o cuidado de não engolir as cascas e nem os caroços, que eram cuspidos do alto do pé, para não termos de enfrentar uma lavagem intestinal, prometidas pelo "farmacêutico" caso ocorresse novo entupimento. De vez quando, minha tia solicitava que eu trouxesse uma vasilha cheia de jabuticabas, para ela preparar geleias e licores. Assim, com um pedido destes, tipo uma "autorização de um adulto" para subir na árvore, passava boa parte do dia chupando jabuticaba e enchendo a vasilha até a boca. Fora dos períodos em que havia abundancia de tais frutinhas, o pé de jabuticabeira, tinha outra finalidade. Era o local onde debaixo de seus frondosos galhos, montávamos o nosso circo, com picadeiro e tudo mais a que tínhamos direito. Depois de ver alguns circos que tinham bons trapezistas como o "Águias Humanas", eu e alguns colegas, resolvemos praticar alguns números de trapézio, improvisando uma forte corda amarrada em algum galho mais grosso. Na parte mais baixa da corda, colocávamos uma madeira roliça, tipo um cabo de vassoura, que deixava a corda esticada, como se fosse um verdadeiro trapézio. Assim, depois de subirmos por uma outra corda que ia até o chão, começávamos a fazer números, na corda que tinha a madeira, primeiro sentando nela e depois a balouçando pra lá e pra cá , até ir bem alto. O clímax do show era quando neste balanço louco, jogávamos o corpo para trás e ficávamos assim pendurados de cabeça para baixo, neste vai e vem seguros apenas pelos pés, sendo saudados com muitas palmas pelos que estavam como que na nossa "platéia". Para evitar que alguma queda nos machucasse muito, botávamos vários carrinhos de pó de serra em baixo, para amortecer as inevitáveis quedas. Mas não tinha jeito, quando caíamos era uma dor danada, principalmente na cabeça e pescoço, andando alguns dias meio torto, como se tivéssemos um grande torcicolo. Apesar de algumas fraturas e luxações que alguns tiveram, era uma infância sadia que nos permitia viver a vida e não apenas vê-la numa tela fria. Hoje eu vejo as crianças, como que aprisionadas em seus quartos, passando o dia inteiro em frente a um computador ou vídeo game, desconhecendo o que é um subir num pé de frutas para colher e saborear seu néctar. Perto da minha casa atual, tem também um terreno baldio e no meio deste há um pé de jabuticabas, ainda novo, pois não chegou para ele o período de floração. Fico imaginando que quando isto ocorrer e ele ficar carregado daquelas frutinhas pretas, vou pular a cerca e chupar jabuticaba até não poder mais.      

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